Notas

Apologéticas

Bispo Alexander Mileant

Traduzido por Elga Drizul Silvandira Féix dos Santos

 

Conteúdo: A Harmonia das Duas Revelações. Deus e o Mundo. Inspiração Divina da Sagrada Escritura. O Livro de Gênesis. O Relato da Bíblia sobre a Criação do Mundo e do Homem. As Causas e as Conseqüências do Ateísmo. O Bem e o Mal. Moralidade na Perspectiva de Deus e da Eternidade. O Zelo de Deus. A Fé na Santíssima Trindade. Vencendo a Ociosidade e o Desânimo. 9Ί Av.

 

A Harmonia das Duas Revelações

O Senhor se revela ao homem de duas maneiras: diretamente, através da iluminação espiritual da alma humana e através da natureza, que pela sua organização testemunha sobre a sabedoria, bondade e o poder do seu Criador.

Já que a Fonte destas revelações — a interna e a externa — é única, os conteúdos dessas revelações devem se complementarem e sob nenhuma circunstância podem se contradizerem.

Por isso, devemos aceitar que entre a ciência pura, baseada nos fatos do estudo da natureza e a Sagrada Escritura, testemunha escrita da iluminação espiritual, deve existir total concordância em tudo que se relaciona ao conhecimento de Deus e Seus Atos.

Ainda que, no decorrer dos tempos, surgiram, às vezes conflitos severos entre os representantes da ciência e da religião (da católica, principalmente), analisando-se atentamente os motivos desses conflitos, é fácil convencer-se de que eles surgiram por falha de entendimento.

O fato é que a religião e a ciência têm suas metas individuais e suas metodologias, e por isso, elas podem tocar-se apenas parcialmente em algumas questões de princípios, mas não há como coincidir totalmente.

"Conflitos" entre a ciência e a religião surgem por exemplo, quando os representantes da ciência manifestam opiniões próprias e sem fundamentos sobre Deus, como: sobre a causa primeira do surgimento do mundo e da vida, sobre a meta final da existência do homem, etc. Estas opiniões dos homens da ciência não se baseiam em fatos da ciência, mas são formadas a partir de conclusões precipitadas e superficiais, absolutamente não científicas.

Da mesma forma, conflitos entre a ciência e a religião surgem quando os representantes da religião, querem demonstrar as leis da natureza baseados no seu entendimento dos princípios religiosos. Assim por exemplo, a inquisição romana condenou o ensinamento de Galileu sobre o movimento da Terra em torno do Sol. Eles achavam que, já que Deus criou tudo para o homem, a Terra deveria encontrar-se no centro do universo e tudo deveria girar em torno dela. Isso, é claro, é uma conclusão arbitrária, não baseada na Bíblia, já que estar no centro dos cuidados de Deus nada tem a ver com o centro geométrico do mundo físico (o qual, provavelmente nem sequer existe).

Os ateístas, no final do século passado e no início deste, ironizavam sobre o relato da Bíblia a respeito do fato de inicialmente Deus ter criado a luz. Eles ridicularizavam os crentes: "De onde a luz poderia vir, já que não havia sido criada a sua fonte — o Sol!" Mas a ciência atual progrediu muito em relação a essa noção infantil e ingênua sobre a luz.

Segundo os estudos atuais da Física, luz e matéria são estados diferentes de energia e podem existir e passarem de um estado para outro, independente dos astros celestes.

Felizmente, conflitos semelhantes entre a ciência e a religião, se resolvem por si mesmos quando o entusiasmo da discussão cede lugar a um estudo mais profundo da questão.

Poucas pessoas são capazes de alcançarem um equilíbrio estável entre a fé e a razão. Uns acreditam cegamente na razão humana e estão prontos para acatarem qualquer teoria por mais precipitada e desprovida de provas que seja, como por exemplo: sobre o surgimento do mundo e da vida na Terra, independente do que dizem as Sagradas Escrituras a esse respeito. Outros desconfiam da desonestidade e das más intenções dos homens da ciência e evitam tomar conhecimento das descobertas positivas da ciência, nas áreas da paleontologia, biologia e antropologia, para não abalarem a fé na verdade da Sagrada Escritura.

No entanto, se seguirmos as observações abaixo, jamais deveremos ter sérios conflitos entre a fé e a razão:

Além disso, devemos saber distinguir entre os dados exatos da ciência e as suposições e conclusões dos cientistas. Os fatos sempre permanecem como fatos, mas as teorias científicas, construídas sobre eles, às vezes mudam totalmente com o aparecimento de novos dados. Do mesmo modo, devemos distinguir entre o que a Sagrada Escritura diz e as interpretações da mesma. Os homens entendem a Sagrada Escritura de acordo com o seu desenvolvimento espiritual e intelectual e de acordo com sua bagagem cultural. Por isso, não se pode exigir infalibilidade em questões que se referem concomitantemente à religião e à ciência.

Os temas sobre o surgimento do mundo e do homem sobre a Terra, são abordados em apenas dois dos primeiros capítulos do livro de Gênesis. Deve-se dizer que não há em toda a literatura mundial, um outro livro que tenha sido lido com maior interesse do que este, de inspiração divina.

Por outro lado, parece que nenhum outro livro foi submetido a críticas tão cruéis e injustas, quanto o Livro de Gênesis. Por isso, queremos dizer algo em defesa deste Livro Sagrado, assim como em defesa de seus dois primeiros capítulos. A seguir, pretendemos falar dos seguintes assuntos: a inspiração divina da Sagrada Escritura; o autor e as circunstâncias em que foi escrito o Livro de Gênesis; os dias da criação; o homem como representante dos dois mundos; as qualidades espirituais do homem primitivo; a religião dos homens primitivos; as causas do ateísmo; etc.

 

Deus e o Mundo

(A respeito das descobertas astronômicas atuais).

"A inteligência humana individual ou coletiva não consegue captar rápida e completamente os mistérios da existência, mas, desenvolvendo-se aos poucos e tornando-se mais nobre, em doses homeopáticas, começa a integrar-se com a sabedoria divina, aprendendo com os erros e os enganos."

Esse pensamento correto e expresso de uma forma belíssima pelo superior Genadi Eicalovich tem se confirmado em descobertas científicas do século XX, sobre as quais desejamos falar aqui.

Até o início de nosso século, os cientistas como um todo e os astrônomos em particular, achavam que o universo era eterno em tempo e infinito em espaço. Eles admitiam transformações do mundo somente em algumas partes das mais longínquas, como por exemplo, no desenvolvimento de sistemas estelares, mas consideravam que as partículas elementares, que formam a matéria e as leis da física eram eternas.

Este conceito ingênuo dos cientistas sobre a "eternidade" ou estabilidade do mundo, foi derrubado na primeira metade do nosso século. Em 1913, o astrônomo Vesto Melvin Slipher, utilizando um potente telescópio nas observações espectrais das galáxias, descobriu que todas elas, independente do direcionamento do telescópio, afastam-se com grande velocidade do nosso sistema solar. Além disso, ele constatou que a velocidade de seu afastamento é proporcional à sua distância. Em outras palavras, Slipher verificou que o nosso universo está em expansão, ou seja dilatando-se como se fosse um imenso balão.

Devemos citar rapidamente aqui ao que se chama de galáxia do sistema estelar, com muitos bilhões de estrelas, que giram em torno de seu centro galáctico, sob a ação do campo gravitacional que as atrai. Por exemplo, o nosso sistema solar encontra-se na borda da galáxia de tamanho médio chamada de "Via Láctea." A galáxia mais próxima de nós chama-se "Andrômeda," distante de nós mais de dois milhões de anos-luz.

Todo o universo é formado por bilhões de galáxias de diversos tamanhos e formas.

A descoberta de Slipher sobre o universo em expansão abalou o mundo científico. Ficou evidente para todos, a conseqüência desta descoberta, que derrubou os conceitos da ciência tradicional. Se o universo está em expansão, isto significa que algum momento no passado ele estava concentrado num ponto — conseqüentemente ele não é eterno, nem infinito. Que força levou esse ponto ao movimento, de modo que dele se originou esse universo colossal? Diversos laboratórios do mundo, começaram a repetir as observações espectrais de galáxias distantes de forma intensiva. A conclusão de Slipher foi confirmada: o universo se expande com inacreditável velocidade. Os locais do universo mais longínquos de nós estão se afastando com velocidade próxima à da luz. Enfim, foi calculado que o nosso universo surgiu há aproximadamente 15 bilhões de anos, quando o ponto microscópico explodiu com força colossal, emitindo radiação para todos os lados. De acordo com a opinião dos cientistas modernos, até o momento dessa explosão não existiam nem a matéria, nem o tempo e nem o espaço. À medida que se esfriava, a radiação inicial começou a condensar-se em átomos e ao mesmo tempo começaram a surgir as forças da natureza, que depois se tornaram leis da física. Depois, os átomos começaram a agrupar-se em nuvens gasosas; as nuvens gasosas começaram a condensar-se em estrelas e em sistemas estelares. Desta forma, suscintamente, surgiu o universo. A teoria sobre o surgimento do universo chama-se em inglês "the Big Bang" ou "a grande explosão." Será que não é sobre esta explosão que a Bíblia diz: "E Deus disse: Exista a luz. E a luz existiu" (Genesis 1:3).

Aqui é interessante mencionar, a grande polêmica que surgiu entre os cientistas, a respeito da descoberta de Slipher. Muitos deles tentaram salvar a teoria antiga da estabilidade do mundo com tal fervor como se estivessem defendendo um dogma intocável. Nesta polêmica tornaram-se evidentes o preconceito próprio dos homens e a falta de objetividade, males dos quais sofrem os homens da ciência que por sua vez não menos, que os fanáticos religiosos.

Surgiram tentativas de contestar os argumentos de Slipher e de seus correligionários. Mas é difícil lutar contra fatos, porque eles são, como se diz, teimosos. Até um grande cientista como Einstein, fundador da física moderníssima e que professava abertamente a sua crença na existência em Deus, durante 17 anos não concordou com a nova descoberta sobre o surgimento do universo. Certa vez, ele até disse: "Isto (a expansão do universo) me irrita ... Aceitar esta possibilidade me parece sem sentido." Reparem no emocionalismo destas palavras, tão inadequadas para uma discussão científica!

Mais tarde, o matemático Alexander Friedman e o cientista George Lemetres mostraram a Einstein, que nas suas próprias fórmulas da teoria da relatividade, existe uma solução sobre o universo em expansão. Einstein concordou definitivamente com o fato da expansão do universo em 1930, quando visitou pessoalmente o melhor observatório da época no Monte Wilson, na Califórnia.

O cientista Edwin P. Hubble (1889-1953) trabalhou muito na área de medição do movimento das galáxias. Graças a ele, as conclusões anteriores foram confirmadas e detalhadas. Atualmente, todos os cientistas aceitam sem discussão o fato do universo se expandir.

Agora vamos dizer algumas palavras sobre como se mede o movimento dos corpos de luz tão distantes de nós. As medidas de velocidade do movimento são feitas a partir do princípio da comparação espectral. Sabe-se que muitos elementos em estado incandescente emitem luz de um determinado tipo espectral (uma determinada seqüência de linhas coloridas e pretas). Analisando a luz emitida pelas estrelas, pode-se determinar de quais elementos químicos estas estrelas são constituídas. O movimento das estrelas em nossa direção se determina, pelo fato da característica espectral da luz emitida por elas deslocar-se para o lado da cor ultra-violeta, e o afastamento do corpo de luz desloca a radiação espectral para o lado do infravermelho (red shift).

Mudança de freqüência do som semelhante nós observamos, quando escutamos o barulho do motor de um automóvel inicialmente se aproximando e depois se afastando de nós. Assim, inicialmente ouvimos o som numa freqüência mais alta e depois numa freqüência mais baixa.

Tendo feito medições espectrais das radiações características (por exemplo de cálcio e de hidrogênio) emitidas pelas estrelas, os cientistas determinam a sua velocidade em relação a nós.

Verificou-se que a luz que chega a nós dos sistemas luminosos distantes, invariavelmente se distingue pelo espectro deslocado para o lado da cor vermelha.

A teoria do surgimento repentino do mundo pela explosão de força e temperatura colossais foi mais uma vez confirmada pelo seguinte fato. Em 1948, um cientista russo vivendo nos EUA, George Gamow, calculou que se o universo surgiu de uma explosão, os restos desta explosão deviam manifestar-se no nosso tempo em forma de uma radiação eletromagnética fraca, que corresponde à temperatura de 3 graus acima do zero absoluto. Ele previu que esta radiação deveria chegar até nós de todos os lados em quantidade totalmente uniforme. Realmente, em 1965 os cientistas Arno Penzias e Robert Wilson determinaram a existência dessa radiação (background radiation), em total concordância com a previsão de Gamow. Esta radiação é emitida pelo espaço interestelar, independentemente dos corpos celestes luminosos. Ela é o rastro antigo da potente explosão que ocorreu.

Que significado tem para nós, que acreditamos em Deus, todas essas descobertas científicas? Elas tem um grande significado religioso-filosófico. Em primeiro lugar, elas confirmam a nossa crença, que o mundo foi criado do nada e num determinado instante de tempo. Elas reforçam a nossa fé que somente Deus é Todo Poderoso, Eterno e Infinito. Todo o resto que nos rodeia, é limitado no tempo e no espaço. Pela vontade do Criador, tudo surgiu e pela Sua vontade tudo pode voltar ao nada, de onde surgiu.

Em segundo lugar, vemos que a ciência através de seus caminhos trabalhosos e tortuosos, devagar e sempre, se aproxima da verdade. Por isso, uma pessoa que crê, não deve temer a ciência como um inimigo. As conquistas positivas da ciência podem somente enriquecer o entendimento religioso. Por exemplo, no início do século XX, os materialistas queriam destruir a religião com o auxílio da ciência. Porém a própria ciência com as suas novas descobertas, destruiu os suportes nos quais os materialistas se apoiavam. Verificou-se que a matéria como substância sólida, original, não existe. A matéria é um estado temporário condensado da energia; esta força misteriosa, originada em algum lugar fora dos limites do universo físico.

Lembrando dos erros freqüentes do passado, a ciência moderna deve ser mais prudente em suas declarações, no que se refere a questões de princípios. Que o pequenino cérebro humano reverencie a infinita Sabedoria do Criador!

 

Inspiração Divina

da Sagrada Escritura

O centro de atenção de alguns artigos seguintes será o Livro de Gênesis, já que está intimamente ligado a uma série de temas atuais científicos e morais. No entanto, antes de passarmos à discussão do conteúdo do Livro de Gênesis, é necessário esclarecer uma questão anterior, a que trata da sua inspiração divina e da veracidade histórica.

O fato é que a crítica bíblica atual introduziu uma grande quantidade de opiniões contraditórias a respeito da origem e da veracidade do Livro de Gênesis. Pesquisadores bíblicos modernos e não ortodoxos não se constrangem em referir-se a muitos relatos do Livro de Gênesis (e de outros Livros Sagrados), como mitos, lendas e fatos distorcidos. Essa atitude tão desrespeitada para com o Livro Sagrado ocorre não por seu conteúdo, como veremos mais tarde, mas por aquelas premissas sobre as quais repousa a ciência da Bíblia moderna no mundo não ortodoxo.

Inicialmente, os modernos estudiosos da Bíblia encaram com prevenção os relatos que contém fatos milagrosos, sobrenaturais. Em segundo lugar, ao interpretar os acontecimentos arcaicos, a moderna crítica bíblica dá preferência em veracidade aos escritos extra-Bíblicos, alegando que ali pode haver muita ficção.

O maior defeito da moderna ciência bíblica vem a ser não a negativa, mas em todo caso o fato de ignorar a Origem Divina e a Ajuda Divina na confecção e na conservação da Sagrada Escritura.

Uma atitude completamente diferente em relação à Sagrada Escritura direciona o pensamento teológico ortodoxo. Aqui, o estudo da Escritura se baseia na fé em sua origem divina. O objetivo deste artigo será explicar o ensinamento da Igreja sobre a inspiração divina da Sagrada Escritura e levantar alguns argumentos, nos quais este estudo se baseia.

Como entender o estado de inspiração divina dos que escreveram a Sagrada Escritura? Será que eles eram apenas instrumentos impessoais da ação do Espírito Santo, semelhante à caneta na mão de quem escreve? Nesse caso, não pode haver nos escritos sinais humanos individuais. No entanto, sente-se constantemente a personalidade do escritor, deste ou outro livro da Bíblia.

Não se pode nunca confundir Isaías com Jeremias, os evangelistas Marcos e João — cada um dos escritores inspirados divinamente tem sua forma e estilo. Isso testemunha que Deus, inspirando o escritor sobre o que escrever, não anula as suas qualidades naturais, não tolhe nem a sua mente nem a sua vontade.

Sobre esse assunto, o apóstolo Paulo escreveu: "Os espíritos dos profetas estão submissos aos próprios profetas" (1 Cor 14:32). Por outro lado, será que pode-se considerar inspiração divina alguma inspiração poética, que às vezes ocorre com os escritores dos livros não sacros? Tal entendimento da inspiração divina, de fato nega a origem divina da Sagrada Escritura e coloca-a no mesmo nível da literatura leiga.

No Dicionário Enciclopédico Ortodoxo Completo (Vol I, St. Petersburgo), define-se a inspiração divina da seguinte forma:

"Inspiração divina é uma ação especial do Espírito Santo sobre os pregadores da revelação divina, que os leva ao entendimento e a transmissão dessa ... No entanto, o espírito humano, tornando-se um instrumento da revelação divina, conserva e manifesta ativamente todas as suas forças e qualidades ... assim como em Cristo a natureza divina e a humana se encontram em unidade orgânica, da mesma forma, no trabalho de anunciação da Revelação Divina, tudo decorre de Deus e ao mesmo tempo, em tudo se manifesta a livre iniciativa do homem."

A convivência dessas duas vontades — a de Deus e a do homem, no trabalho de anunciação da verdade divina aparece na nota autobiográfica do profeta Jeremias.

Jeremias tinha resolvido parar de profetizar aos habitantes de Jerusalém sobre as desgraças que viriam, porque a sua vida corria perigo diariamente por isso. "E pensei eu — escreve Jeremias — não mais falarei em Seu Nome. Mas em meu seio havia um fogo devorador que me encerrara nos ossos. Esgotei-me em refreá-lo, e não o consegui" (Jer. 20:9).

Aqui nós vemos a ação de Deus inspirando o que deve ser dito e a consciência do profeta da sua liberdade em reter dentro de si a Palavra Divina. Os próprios escritores dos Livros Sagrados viam com veneração a sua missão de anunciar aos homens a vontade de Deus.

O profeta Moisés, que tinha a língua presa, não conseguia entender, como ele podia pregar a palavra de Deus, tendo um defeito físico tão grave. Então, o Senhor mandou Moisés levar como ajudante o seu irmão Aarão. "Tu lhe falarás (ao Aarão), por-lhe-ás as minhas palavras na boca. E quando falardes, eu estarei contigo e com ele, e vos ensinarei o que tereis a fazer" (Êxodo 4:14).

O profeta e o rei Davi entendiam deste modo o seu dom de inspiração superior: "O Espírito de Deus fala por mim e a palavra Dele está na minha língua" (2 Sm 23:2).

Os escritores dos Livros Sagrados, tendo sido inspirados em suas capacidades naturais, introduziram Neles também elementos humanos. Sobre este assunto, no "Dicionário Enciclopédico Ortodoxo Completo" está escrito: "...assim como a natureza humana é imperfeita, a presença da livre atividade humana na escrita dos Livros Sagrados pode introduzir neles algumas imperfeições. Por isso, não contradizem a divindade da Escritura certos sentimentos e pensamentos puramente humanos, inexatidões, divergências, etc. que se encontram nos livros. A obra dos escritores é perfeita na medida em que é necessária para os objetivos divinos. Onde, para a salvação humana basta até o conhecimento humano imperfeito, Deus permitiu a imperfeição."

Descrevendo os acontecimentos históricos, os escritores dos Livros Sagrados utilizaram os meios comuns de informação: documentos escritos, tradições orais, relatos de testemunhas e observações pessoais. Nos relatos históricos da Bíblia não faltam também sinais subjetivos.

É fato conhecido que relatos de testemunhas de algum acontecimento não coincidem totalmente em todos os detalhes, apesar de cada uma delas tentar relatar o que presenciou com a máxima exatidão. Esse subjetivismo das testemunhas é considerado evento normal, quando se ouvem casos jurídicos. Nesse aspecto, os relatos paralelos da Bíblia não são exceções.

Se, por exemplo, compararmos os relatos dos quatro Evangelistas sobre a crucificação e a ressurreição de Cristo, em cada um deles veremos detalhes e características próprias. As diferenças nos relatos paralelos da Bíblia normalmente não são difíceis de apaziguar, já que essas diferenças não excluem, mas complementam uma a outra. Infelizmente, a moderna crítica bíblica freqüentemente torna-se muito exigente, em relação a pequenas divergências na Bíblia e procura ver nelas contradições.

Reconhecendo os métodos naturais para conhecer os acontecimentos históricos, a Igreja Ortodoxa acredita que os escritores dos Livros Sagrados selaram nos seus livros tão somente a verdade, que a graça de Deus os iluminou para diferenciar a verdade da mentira.

A crítica bíblica moderna, realça a idéia das fontes e dos escritores da Bíblia. Ela se esforça para estabelecer, quando e por quem foi escrito cada livro (ou parte dele). Na área de fontes e autores de textos bíblicos existe uma enorme literatura científica repleta, infelizmente, de teorias contraditórias e discutíveis.

Do ponto de vista ortodoxo, o teor, inspirado divinamente deste ou outro livro da Bíblia, independe do autor. Os nomes dos autores de alguns livros do Antigo Testamento são desconhecidos. No entanto, os livros escritos por eles, são respeitados da mesma forma que os livros escritos por grandes profetas. A fé da Igreja na inspiração divina de todos os livros canônicos do Antigo Testamento se baseia no testemunho de Nosso Senhor Jesus Cristo e de Seus Apóstolos.

Em suas palestras, o Senhor Jesus Cristo freqüentemente fazia referências aos livros do Antigo Testamento. Por exemplo, Ele testemunhou sobre a veracidade das antigas profecias sobre o Messias: "Examinais as Escrituras, julgando encontrar nelas a vida eterna. Pois bem! São elas mesmas que dão testemunho de Mim" (João 5:39).

O Senhor freqüentemente se referia ao próprio texto das profecias de Moisés, rei Davi, Isaias e Daniel. Mostrava aos judeus a infalibilidade das Escrituras em questões de fé. "Não penseis que vim revogar a lei ou os profetas. Não vim para revogar , mas para cumprir. Pois em verdade vos digo: até que o céu e a terra passem, nem uma coisa mínima ou um traço passará da lei, até que tudo se cumpra" (Mateus 5:17).

A veracidade histórica de vários acontecimentos do Antigo Testamento foi confirmada pelo Senhor, nas suas referências a estes. Assim, Ele citou a criação do homem por Deus; a instituição do casamento; a visão de Jacó; o Abraão; a esposa de Lot em conexão com a destruição de Sodoma e Gomorra; a aparição de Deus; a permanência de Jô no ventre da baleia; o profeta Elias; e outros.

Da mesma forma, os Apóstolos, instruídos por Cristo, ensinavam os cristãos a venerar o Antigo Testamento. Seria necessário muito espaço para relacionarmos aqui todos os acontecimentos históricos do Antigo Testamento, as profecias e citações que os Apóstolos citaram em seus Evangelhos e epístolas. Estas referências múltiplas ao Antigo Testamento, nos dizem, que os Apóstolos acreditavam firmemente na origem divina desses escritos.

O apóstolo Pedro nos diz diretamente: "Jamais uma profecia foi proferida por efeito de uma vontade humana, entretanto homens santos movidos pelo Espírito Santo falaram da parte de Deus" (2 Pe.1:21).

Da mesma forma testemunha também o apóstolo Paulo: "Toda a Escritura é inspirada por Deus, é útil para o ensino, para repreensão, para correção e para educação na justiça" (2 Tim 3:16).

Esses testemunhos diretos do Senhor Jesus Cristo e seus Apóstolos, sobre a inspiração divina dos livros das Sagradas Escrituras, nos convencem a crer na veracidade de tudo que está escrito neles.

 

O Livro de Gênesis

O Livro Sagrado de Gênesis vem a ser um valiosíssimo documento antigo, com o qual não se pode comparar nenhum outro monumento escrito da antiguidade, no que se refere a quantidade de acontecimentos importantes. O Livro de Gênesis, se não for o livro mais antigo da literatura mundial, em todo o caso vem a ser o livro mais antigo, que merece ser chamado de história fidedigna. Tal significado superior do Livro de Gênesis torna-se evidente, comparando-o com outro monumento, escrito próximos à época da sua concepção. Assim por exemplo, os papiros egípcios antigos contém apenas informações fragmentadas, pouco valiosas historicamente. Da mesma forma, os fragmentos da literatura chinesa que se conservaram, contém cálculos astronômicos e alguns escritos de caráter histórico-local.

As tabelas de barro dos sírios e babilônios vem a ser principalmente, documentos jurídicos e comerciais. As informações históricas encontradas nessas tabelas, vem misturadas com contos mitológicos, de modo que torna-se muito difícil separar a verdade da ficção.

De acordo com a tradição, o Livro de Gênesis foi escrito pelo profeta Moisés no ano 1300 A.C. Ele vem a ser o primeiro da série de 5 livros, escritos por ele. No original judaico, os livros do profeta Moisés não tem títulos próprios. Com o tempo, os judeus começaram a chamar cada livro pelas suas primeiras palavras. Assim os judeus chamam o Livro de Gênesis de "Bereshit," o que significa "No princípio," já que com essas palavras é iniciado o relato sobre a criação do mundo.

Os nomes atuais dos livros do profeta Moisés foram tomados da tradução grega da Bíblia, feita no século III A.C. e conhecida pelo nome de "Septuagintos" (i.é. tradução de 70 tradutores).

Na ciência bíblica, esses livros são chamados de "Pentateuco" (ou seja, conjunto de cinco livros).

Considerando Moisés como o autor dos cinco livros da Bíblia, a tradição não afirma que toda e qualquer palavra desses livros foi escrita por ele. Nos seus livros há acréscimos, incluídos sem dúvida após a sua morte, como por exemplo, o relato da sua morte, explicações quanto aos nomes geográficos e dos povos desconhecidos às gerações mais antigas, e outros acréscimos.

O fato de Moisés ter utilizado escritos cronológicos e genealógicos antigos e também resumos de descrição de antigos acontecimentos, não contradiz o entendimento da sua autoria. É fato conhecido que a escrita surgiu 1200 anos antes de Moisés na região da mesopotâmia, terra de Abraão. Abraão pode ter deixado aos seus herdeiros os escritos que depois tornaram-se base do Livro de Gênesis. Pode-se conjeturar sobre a existência de tais escritos naqueles tempos, baseando-se nas citações do livro de Jesus Navin, discípulo do profeta Moisés, "O livro do Justo," que desapareceu posteriormente.

O livro de Moisés, foi escrito durante os 40 anos de peregrinação dos judeus pelo deserto. Pelo seu volume é quase igual ao Novo Testamento. Por isso, é natural supor que o profeta Moisés tinha ajudantes-escribas. Esses escribas, provavelmente, anotaram fatos que tinham relação com o próprio profeta Moisés, porque esses fatos são descritos na terceira pessoa. Claro que os escribas que ajudaram o profeta Moisés a escrever os cinco livros, não poderiam ter estilo próprio definido de escrita, o que é característico apenas de escritores "profissionais." Por isso, não tem nada de estranho, que os pesquisadores atuais da Bíblia, achem partes dos livros do profeta Moisés escritos em diversos estilos.

No entanto, deve-se reconhecer, que a diversidade de estilos depende não apenas da presença dos ajudantes-escribas, mas tanto quanto, do conteúdo das diversas partes dos 5 livros.

Sabemos que terminologia jurídica difere da coloquial, termos de construção ou administração do lar diferem da linguagem contemplativa. E o profeta Moisés tinha que escrever sobre os mais variados assuntos. O fato de, ele ter pessoalmente escrito algumas partes de seus cinco livros, principalmente aquelas onde ele coloca a revelação de Deus, é citado várias vezes no livro Mosaico.

O profeta Moisés é um homem eminente de todas as épocas. Como profeta, ele mereceu uma proximidade especial com Deus, já que, de acordo com a Bíblia, somente com ele "O Senhor falava com Moisés face a face, como alguém fala com um amigo" (Êxodo 33:11). Como escritor e legislador, ele recebeu instrução brilhante para aquele tempo, tendo sido educado na corte do faraó como filho, da filha do faraó, que o adotou desde que ele era bebê.

No livro de Gênesis o profeta Moisés colocou o relato, sobre a criação do mundo e do homem por Deus, sobre a vida de nossos antepassados no Jardim do Éden, sobre o pecado original, sobre a vida dos patriarcas anti-diluvianos, sobre Noé, sobre o Dilúvio, sobre os patriarcas pós-diluvianos: Abraão, Isaac e Jacó.

Paralelamente à vida dos patriarcas, Moisés deixou gravado no livro, muitas informações sobre os reinos antigos e sobre a dispersão dos povos.

O livro de Gênesis termina com o relato sobre José e sobre a mudança da família de Jacó para o Egito. Todo o conteúdo do Livro de Gênesis segue um plano definido, de acordo com o qual ele se divide em dez partes, construídas de acordo com o mesmo princípio. No início de cada parte coloca-se a mesma fórmula introdutória e um título especial.

Depois, segue um resumo dos fatos descritos na parte anterior.

Em todo o Livro de Gênesis sente-se integridade e unidade do plano, que testemunha sobre o redator. O autor do Livro de Gênesis fornece muitas informações históricas valiosíssimas sobre os acontecimentos, que não aparecem em nenhum outro lugar ou que foram anotados em formato distorcido, mitológico. No entanto, o profeta Moisés não coloca como objetivo cobrir no Livro de Gênesis toda a complexidade dos fatos históricos. Da totalidade de informações disponíveis para ele, ele destacou aquilo que tinha relação com a vida religiosa do homem.

Por isso, esse livro não deve ser lido como história crua, mas como fonte de sabedoria espiritual, como livro inspirado pelo próprio Deus.

 

O Relato da Bíblia Sobre a Criação

do Mundo e do Homem

Creio em um único Deus Pai Todo Poderoso, Criador do céu e da terra, de tudo visível e do invisível — professamos na nossa prece diária em casa e no templo. Desta forma, o mundo para nós não é apenas um objeto de conhecimento intelectual, mas também um objeto de fé. Não importa a quantidade de mistérios que a ciência descubra nas áreas de: física, química, geologia, cosmologia, etc ... de qualquer forma continuam não resolvidas questões de princípio para o homem: de onde surgiram as leis da natureza e as partículas das quais o mundo se originou e qual a finalidade de tudo que nos cerca e da vida do homem?

A ciência não é apenas incapaz de responder a estas perguntas que nos perturbam, mas na verdade, nem tem direito de discuti-las porque elas estão acima de seu alcance. Estas perguntas são respondidas pela Bíblia por meio da revelação divina.

O profeta Moisés, nos primeiros capítulos do Livro de Gênesis, colocou o relato sobre a criação do mundo e do homem por Deus. A ciência, até recentemente, nada podia dizer de convincente a respeito do surgimento do mundo. Apenas no século XX, graças a grandes avanços nas áreas da astronomia, geologia e paleontologia, a história do surgimento do mundo começou a ser desvendada pelas pesquisas científicas. E o que se constatou? Acontece que o mundo surgiu de acordo com a seqüência descrita pelo profeta Moisés.

Apesar do profeta Moisés não ter tido como objetivo dar uma explanação científica a respeito do surgimento do mundo, o seu relato antecipou-se em muitos séculos às modernas descobertas da ciência. Sua descrição pela primeira vez testemunhou que o mundo não é eterno, mas surgiu no tempo e numa seqüência progressiva (evolucionária). Também os modernos astrônomos chegaram à conclusão que o mundo não é eterno, quando descobriram que o mundo está em expansão, semelhante a um balão se dilatando. Há 15 ou 20 bilhões de anos, todo o universo estava concentrado num ponto microscópico, que tendo explodido começou a expandir-se para todos os lados, formando pouco a pouco,o nosso mundo visível "Big Bang."

A criação do mundo por Deus, Moisés dividiu em 7 períodos, que chamou simbolicamente de "dias." Durante seis "dias" Deus criou o mundo e no sétimo — descansou. Quanto duraram esses "dias," Moisés não determina. O sétimo dia, durante o qual desenvolve-se a história da humanidade, já está durando vários milhares de anos. O próprio número 7 é freqüentemente usado nas Escrituras no sentido simbólico e não no quantitativo. Significa plenitude, conclusão.

"No princípio Deus criou o céu e a terra" — com estas palavras a Bíblia abrange tudo aquilo que Deus criou: nosso mundo material visível e aquele mundo espiritual angelical que se encontra fora do alcance da nossa observação física. A palavra "criou" diz que o mundo foi feito por Deus do nada.

Essa é a conclusão das descobertas científicas atuais: quanto mais fundo avança a física atômica nas bases da matéria, mais se torna evidente o "vazio" da matéria. Aparentemente, até mesmo os "quarks" que formam os prótons, não são partículas sólidas. Decorre que a matéria é um estado inexplicável de energia.

Lendo mais adiante a descrição da Bíblia sobre o surgimento do mundo vemos que, na verdade e em linhas gerais, há concordância com o que a ciência moderna diz a esse respeito. Não tendo abordado detalhes sobre o surgimento de galáxias após este "no início," o relato de Moisés se concentra na formação da nossa Terra e de tudo que a preenche. Assim, no primeiro "dia:" "E disse Deus: haja luz."

Essas palavras aparentemente apontam para o momento, em que os gases e a poeira interestelar que formariam o sistema solar, condensaram-se tanto sob a ação do campo gravitacional, que no centro da esfera de gases iniciou-se uma reação atômica (queima de Hélio e Hidrogênio) com abundante emissão de luz. Assim, formou-se o Sol. A luz é o fator que mais tarde permitiu o surgimento da vida na terra.

Os mesmos gases e poeira que formaram o Sol, formaram também os cometas, micro-meteoritos, asteróides, protoplanetas, etc ... Toda essa massa de gases, poeira e corpos sólidos, que girava e deslocava-se rapidamente em todas as direções foi chamado por Moisés de "água."

Sob a ação da gravidade mútua, com o tempo, ela formou os planetas. Isto vem a ser "a separação das águas que ficam sob o firmamento" no segundo dia da criação. Assim o sistema solar, ou o "céu" de acordo com a Bíblia, tomou o seu aspecto final.

No início, a Terra e outros planetas estavam incandescentes. A água que evaporava das profundezas da terra a envolvia com nuvens espessas. Quando a superfície da Terra esfriou o suficiente, a água começou a condensar em forma de chuva e formaram-se mares e continentes. Depois, graças à ação da luz solar e a água começaram a surgir plantas sobre a Terra. Isto é o terceiro "dia" da criação.

A vegetação gigantesca pré-histórica (e também os microorganismos que viviam na água) começaram a limpar a atmosfera terrestre do gás carbônico, produzindo oxigênio. Até esse momento, se alguém olhasse para o céu a partir da superfície da Terra, ele não conseguiria ver os contornos do Sol, da lua ou estrelas já que a Terra estava envolvida por camada espessa de gases.

Assim, por exemplo, até hoje da superfície de Vênus não dá para ver o céu porque o planeta está até hoje envolvido pelos mesmos gases espessos. Eis porque a aparição do Sol, lua e estrelas foi colocada por Moisés no dia posterior ao das plantas, i.é., no quarto "dia."

Não conhecendo esse fato, os materialistas — ateus, no início do século, riam dos relatos da Bíblia sobre a criação do Sol após as plantas. Segundo a Bíblia, a luz solar difusa atingia a superfície da Terra desde o primeiro dia da criação, apesar de não poder se ver os contornos do Sol.

O surgimento do oxigênio puro na atmosfera serviu por sua vez para o surgimento de formas mais complexas de vida — peixes e aves (no quinto "dia"), e enfim, animais e homem (no sexto "dia").

A ciência atual concorda com essa seqüência de aparição de seres vivos.

No relato bíblico, muitos detalhes interessantes para a ciência sobre o surgimento dos seres vivos foram omitidos por Moisés. Mas deve-se lembrar que a sua meta não era enumeração de detalhes mas para mostrar a causa primeira do mundo, o seu sábio Criador. Moisés conclui o seu relato sobre a criação do mundo com as palavras: "Deus contemplou toda a sua obra e viu que tudo era muito bom." Em outras palavras o Criador tinha um objetivo determinado durante a criação do mundo: para que tudo sirva para o bem, que leve ao bem. A natureza até hoje conserva em si a marca do bem e testemunha não somente sobre a sabedoria, como também sobre a bondade do seu Criador.

De acordo com o Livro de Gênesis, o homem foi criado por último.

A ciência atual também considera o homem como o ser mais novo do mundo animal.

Na questão do surgimento do homem, a diferença entre a ciência e a Bíblia se resume no método e na meta. A ciência tenta determinar detalhes sobre o aparecimento do lado físico do homem — do seu corpo, e a Bíblia fala do homem, em seu aspecto final, tendo, além do corpo, uma alma semelhante a Deus e dotado de razão. No entanto, a Bíblia afirma que o corpo do homem foi criado da "terra," i.é., dos elementos da terra, assim como os corpos dos outros animais.

Esse fato é importante porque a Bíblia confirma o fato da proximidade física entre o mundo animal e o homem.

Mas a Bíblia enfatiza a exclusividade do homem no mundo animal, como portador do "sopro Divino," da alma imortal. Graças à alma semelhante a Deus, o homem tem um discernimento espiritual especial, que lhe permite distinguir entre o bem e o mal. Esse discernimento espiritual atrai o homem para o relacionamento com Deus e com o mundo espiritual, para o aperfeiçoamento moral. Em última instância, somente prazeres terrenos não podem saciar a sede espiritual do homem. Estes fatos confirmam o testemunho da Bíblia, que o homem não apenas atingiu o grau evolutivo superior do reino animal, mas é uma representação simultânea dos mundos: físico e espiritual. A descoberta desse mistério, auxilia o homem a encontrar o seu lugar correto no mundo e a ver a sua vocação para fazer o bem e avançar em direção a Deus.

Concluindo a nossa breve visão do relato Bíblico sobre a criação do mundo por Deus, deve-se dizer que nesse relato (assim como no seguinte: sobre a vida de nossos antepassados no paraíso e o pecado original, além dos acontecimentos passíveis de compreensão) existem símbolos e sentidos figurados, cujo significado não nos é totalmente compreensível. O significado dos símbolos, é que eles dão ao homem a possibilidade de eliminar detalhes de difícil compreensão e entender a importante mensagem que Deus nos revela: neste caso é a mensagem sobre a causa do mal, das doenças e da morte, no mundo.

A ciência continua a árdua investigação do universo. Ela descobre muitas coisas novas e interessantes, que ajudam o homem a entender a Bíblia mais completa e profundamente. Mas, freqüentemente acontece como diz o ditado popular, que os cientistas "não enxergam a floresta, atrás das árvores." Por isso para o homem, o entendimento dos princípios deve ser mais importante que os detalhes.

O significado da Bíblia é exatamente este; Ela nos revela os princípios da nossa existência e isto A mantém significativa mesmo com o passar do tempo.

 

As Causas e as

Conseqüências do Ateísmo

Chamamos ateístas as pessoas que não acreditam na existência de um ser superior chamado Deus. Uns não crêem porque ninguém nunca lhes falou sobre Ele, e eles mesmos nunca pensaram sobre Deus. Outros, apesar de em princípio não negarem a existência de Deus, de fato vivem como se Ele e suas leis não existissem. Podem ser considerados na prática como ateístas.

Finalmente, existem pessoas que negam a existência de Deus por princípio e que querem justificar a sua descrença com razões científicas ou filosóficas. Essas pessoas podem ser chamadas de ateístas conscientes.

O ateísmo por princípio, teórico, freqüentemente evolui para a luta ativa contra Deus, quando implantado à força, como ocorre em países comunistas. O ateísmo teórico na realidade vem a ser anti-religião, porque ele também se baseia na crença. A religião se baseia na crença, na existência de Deus, e o ateísmo na crença, que Ele não existe.

Realmente, se Deus é espírito, como se pode provar que Ele não existe, utilizando-se de métodos materiais? Essa prova é comparada a alguém que rejeita a existência do campo magnético da Terra, baseando-se nas leituras de barômetro.

No ateísmo, a crença em Deus é substituída pela crença na existência da matéria e nas leis da natureza.

O ateísmo, como manifestação de massa, surgiu nos últimos 200 anos. É uma conseqüência da quebra do contato direto do homem com a natureza, que ocorreu quando uma parte significativa da população começou a migrar do interior para as cidades. A psicologia diz que é natural para o homem tentar entender a causa primeira (o porquê) e a finalidade da sua existência. No processo de meditação sobre as questões básicas da existência, o homem chega à fé no Criador do universo. A natureza com a sua beleza, poder, harmonia e orientação, como se a cada passo falasse de Deus, sobre Seu poder e Sua bondade, ajuda o homem a chegar até Ele.

Antigamente, as pessoas encontravam-se mais próximas da natureza e era raro encontrar um ateísta. É fato conhecido que a idéia de um Ser Superior, sempre esteve presente entre os homens de todos os níveis, desde os tempos pré-históricos. "Olhem a face da Terra, — (escreve Plutarco 1 século após o nascimento de Jesus Cristo) — e vocês encontrarão cidades sem fortificações, sem ciência, sem hierarquia, verão pessoas sem habitação permanente, sem utilização de moedas, sem noção de belas artes, mas não encontrarão nenhuma sociedade humana sem fé na Divindade."

Esse testemunho continua válido até hoje em relação às pessoas que vivem próximas à natureza, apesar do seu conceito de Deus ser imperfeito e ingenuamente infantil.

Por outro lado, é a vida de um cidadão moderno, que vive na agitação diária entre barulho de carros, selva de pedra, fumaça e crimes constantes. Essa vida não traz ao homem nenhum sentimento sutil ou nobre, ao contrário, ela o aleija espiritualmente. Portanto, não é de estranhar que, da mesma forma que o ateísmo, diversas enfermidades psicológicas se desenvolvem mais freqüentemente entre os habitantes de grandes cidades.

Também trabalha a favor do ateísmo o sistema de educação anti-religioso ou sem religião, adotado em muitos estabelecimentos de ensino moderno.

Encontram-se freqüentemente nos livros de estudo e nas salas de aula, críticas a respeito do relato bíblico sobre o surgimento do mundo e do homem. Em vez de complementar e ampliar as informações da Bíblia, as descobertas da ciência são colocadas em oposição às verdades inspiradas por Deus e causa-se um conflito entre a fé e o conhecimento.

Os professores ou educadores, às vezes riem e ridicularizam abertamente os princípios da fé e da moral. Raros jovens possuem raciocínio independente e suficientemente forte, para ver que os ataques anti religiosos dos professores, não são baseados nos dados objetivos da ciência, mas baseados em opiniões próprias de pessoas, não simpáticas à religião. Os pais ou estudantes necessitam de muito conhecimento e capacidade para conservar a sua fé em Deus.

Já que o pecado turva a inteligência e abafa a consciência; um modo indisciplinado de vida do homem também contribui para o enfraquecimento da fé em Deus. Acontece que jovens educados em famílias religiosas e muito crentes na infância, sucumbem às tentações de prazeres pecaminosos e são enredados por paixões da carne. Com o passar dos anos em um modo de vida pecaminoso, pouco sobra neles de sua antiga inocência, modéstia e bondade. Eles se tornam arrogantes, maus e desavergonhados. Simultaneamente com estes defeitos surgem dúvidas religiosas, que podem evoluir para a descrença, caso eles não se dêem conta e não procurem arrependimento em Deus.

A conseqüência do ateísmo é o desespero. A maior parte desse desespero não é consciente para o descrente, mas penetra no seu subconsciente e determina o seu modo de vida. Já que não há Deus, significa que também não há outra vida, não há recompensa pelo trabalho e boas ações.

Por isso, o ateísta se apressa em usufruir de todas as coisas boas da vida, enquanto está vivo. Já que não há Deus, então também a lei moral é subjetiva e a diferença entre o bem e o mal é estabelecida pelo próprio homem. Claro, a lei governamental, vergonha, medo, ou algum outro raciocínio prático podem frear os impulsos de obter prazeres e coisas boas da vida de qualquer maneira, mas o âmago da visão ateísta do mundo não se altera por isso.

Os animais e os insetos podem ser cruéis com suas vítimas. Mas não existe ser mais perigoso e cruel do que um homem sem orientação moral superior. Este homem é capaz de praticar o mal não apenas para sair ganhando algo, mas também por um prazer pervertido. Ele se vinga nos outros, pelo fato de ser infeliz. E ele é infeliz porque não tem futuro. Eis porque a maioria dos crimes mais cruéis e sem sentido ocorrem em países onde o ateísmo conseguiu a posição de liderança.

Como pode o homem chegar à fé em Deus ou reforçar a fé em Sua existência? Na filosofia e em apologética existem as chamadas "provas" da existência de Deus. Essas provas dizem que admitir a existência de Deus é uma decorrência lógica da observação da organização da natureza, das qualidades espirituais do homem e dos fatos históricos.

Citar aqui todas essas provas ocuparia muito espaço. Eu gostaria apenas de dizer, que nenhum fator externo da existência de Deus, pode ser mais convincente do que a experiência espiritual interior do homem. Pois Deus é um Ser espiritual, Ele não pode ser conhecido por métodos meramente científicos. Mas a alma, criada à Sua imagem e semelhança, pode ter o contato direto com Ele. Quando o homem faz um esforço para dissipar as trevas do rebuliço em que a sua vida corre e com todas as forças da alma se dirige à Luz Divina que nos rodeia por todos os lados, então ele vê e ouve Deus.

Essa sensação pessoal de Deus não dá para provar ou explicar a outras pessoas, porque isso se refere à esfera da experiência interior. Quem não passou por essa experiência interior, não pode entender sobre o que está se falando.

Essa experiência pessoal de contato com a Graça Divina, torna-se para o homem, a prova mais convincente da existência de Deus. Mas, essa experiência obriga o homem a mudar a sua vida moral, aprender a sacrificar-se para obedecer à Vontade Superior. Muitos temem despertar a sua consciência, não querem mudar o seu modo de vida pecaminoso e por isso não se esforçam para entrar em contato com a Luz Divina. Mas, os que tem contato com essa luz, acham nela uma fonte de força espiritual, de paz e de alegria, não terrena.

 

 

O Bem e o Mal

A questão do bem e do mal é estudada pela religião, filosofia, psicologia e ciências sociais. No seu sentido comum, chamamos de bem tudo que nos atrai, que desperta em nós sentimentos elevados — aquilo, que queremos imitar, aquilo que queremos que dure para sempre. Chamamos de mal a tudo que o homem avalia negativamente e que é o contrário do bem — aquilo que, em nosso entendimento, não deve existir. Aí estão incluídos : sofrimentos, doenças, destruições, injustiças, perseguições, morte.

Nós aceitamos o bem como algo natural e o mal como algo anti-natural. O mal é um problema que o homem tenta entender desde os tempos imemoriais de sua existência. É tão difícil para o cérebro humano captar o problema do mal, que pode-se ver pelo fato de existirem tantos julgamentos diferentes a respeito e tantas religiões e escolas filosóficas no mundo.

O bem pode ser físico ou moral. O mal também pode ser visto como físico ou moral.

O Bem Moral e o Mal Moral

A experiência mostra que as raízes do bem e do mal penetram profundamente na essência moral do homem. Assim, por um lado, é natural ao homem o desejo de conhecer a verdade e de dar um sentido a sua vida do ponto de vista moral. O homem é atraído pelo bem. Ele tem um sentimento inato de compaixão para com as pessoas e seres vivos em geral. Desse sentimento de compaixão surge nele ímpeto de ajudar, defender, salvar. O homem sente uma satisfação moral quando faz algo de bom para os outros; quando ele ama, perdoa, se sacrifica, quando ele cumpre seu dever como membro da família e da sociedade. Fazendo o bem, o homem desenvolve em si qualidades espirituais positivas: juízo, força de vontade, fidelidade, coragem, paciência, ou seja ele se enobrece espiritualmente.

Por outro lado, surgem no homem inclinações contrárias às que agora citamos, desde a mais tenra infância. Às vezes, o homem quer conscientemente prejudicar de alguma forma o seu próximo. Ele é capaz de magoar, enganar, mentir, prejudicar ou ferir e até mesmo de matar alguém.

Às vezes, o homem comete esses atos negativos visando o proveito próprio, e às vezes sem nenhum motivo aparente, como se achasse prazer em praticar o mal.

Se o homem não refrear os seus maus instintos, com o tempo ele se torna mau como se fosse pela própria natureza: avarento, insaciável, grosseiro, atrevido, falso, traiçoeiro, cruel, provocador, convencido e devasso. O mal, que no início é apenas uma predisposição da vontade para infringir a lei moral, por sucessivas repetições torna-se um hábito pecaminoso, um vício e entrelaça-se com a essência espiritual do homem, tornando-o moralmente mau.

A predisposição para o mal pode se comparar com uma dobra numa folha de cartolina, que a faz defeituosa, pois a cartolina terá a tendência de dobrar-se sempre seguindo a dobra. A ciência é incapaz de explicar porque no homem, junto com as boas, aparecem as más tendências.

A Bíblia explica isto como pecado original.

Tanto quanto o bem enobrece o homem, o mal o aleija. O mal turva a sua razão, enfraquece a sua vontade, corrompe o bom gosto. Com o tempo, o estado moral do homem começa a mudar a sua aparência. É fácil reconhecer uma pessoa que se encontra moralmente degradada, somente pelo seu aspecto externo.

O Bem e o Mal Físico

A natureza é abundante no bem. Alimentos variados não apenas sustentam a nossa vida, mas nos dão prazer. São incontáveis as riquezas da natureza, a abundância e a variedade de legumes, frutas e grãos que o homem utiliza com o alimento. O sol, a água, o ar aquecem e refrescam o nosso organismo. A beleza da natureza, o canto dos pássaros, o perfume das flores e da vegetação trazem muita alegria ao homem. Por isso, um homem de fé, em cada haste de erva sente a mão protetora do Criador.

Mas, mesmo com toda a abundância de bens físicos, o homem não pode fugir dos sofrimentos. Diversas doenças e infelicidades diariamente entristecem a nossa vida. A morte vem a ser o inevitável final da vida física. A inevitabilidade dos sofrimentos físicos às vezes leva o homem a pensar que o mal físico tem existência independente. Alguns imaginaram que a natureza é uma obra de dois princípios opostos: o bem e o mal (duas divindades no dualismo Persa), ou que a matéria carrega o mal em si mesma (budismo, ensinamento dos gnósticos e teosofia moderna).

Pensando sobre o problema do bem e do mal, o homem sempre tentou entender, se eles são conceitos relativos ou absolutos. Ou seja, será que a avaliação do bem e do mal muda conforme as circunstâncias e o nível do desenvolvimento do homem ou o bem e o mal são manifestações boas ou ruins em si?

Como veremos, o conceito do mal físico (sofrimentos) é relativo, porque ele do ponto de vista do desenvolvimento moral do homem, pode servir para o bem. No entanto o mal moral, isto é, o mal absoluto, pode trazer somente o mal.

O Mal Absoluto e o Mal Relativo

Analisando atentamente o mal físico vemos que ele não vem a ser uma existência independente, mas apenas é avaliado negativamente por nós. Realmente, as dores do parto trazem para a mãe o sofrimento, mas ao mesmo tempo criam nela o sentimento de amor à criança. O trabalho executado em condições impróprias, pode desgastar e prejudicar a saúde, mas em condições dignas aumenta as forças, mantém o homem longe do ócio e desenvolve suas capacidades.

Os sofrimentos podem tornar alguém agressivo ou levá-lo ao desânimo, mas podem também torná-lo mais nobre, desenvolver a sua coragem e paciência e ensinar a compaixão. A miséria pode induzir ao roubo e à fraude, mas também pode levar à humildade e ao reforço na confiança em Deus. Por isso, muito daquilo que nós avaliamos como mal físico, do ponto de vista do desenvolvimento moral pode servir para o bem e portanto, para a felicidade eterna. Por isso, o mal físico não tem existência em si, mas vem a ser um conceito relativo.

Não é este o caso do mal moral. Muitas vêzes se comete o mal por causa de um benefício material temporário, no entanto ao lado dessa vantagem aparente, o mal aleija o lado moral do pecador e causa mal a outras pessoas. Pode-se compreender por acaso, quando alguém cometendo um ato moralmente mau, indiretamente propicia o bem moral?

Por exemplo; um torturador faz um cristão sofrer, torturando-o, com isso permite a manifestação da fé e da paciência do mártir. Aqui, o bem acontece não devido a ação direta do mal moral (crueldade do torturador), mas sim, pelo efeito dual do mal físico: o sofrimento do mártir serve como motivo para a manifestação de sua fé e paciência. No entanto o mal moral como tal, sempre carrega o mal atrás de si. Por isso, o mal moral assim como o bem moral são conceitos absolutos.

 

Moralidade na Perspectiva

de Deus e da Eternidade

Há situações na vida acerca das quais podem surgir opiniões contraditórias, i.é., considerá-las boas ou más. Por exemplo, o divórcio é considerado um mal, já que está ligado à traição, à quebra de promessa, destruição da família e abandono dos filhos. Mas, como avaliar o divórcio que se realiza com vontade mútua e que aparentemente é o melhor para os interessados? Nesse caso, podemos considerá-lo como bem? O Evangelho ensina que qualquer divórcio é uma transgressão da vontade de Deus.

O homem é um ser de conceitos limitados e imperfeitos e por isso, o seu julgamento sobre o bem e o mal pode estar errado. Apenas Aquele Que é a fonte da lei moral, sabe perfeitamente o que é o bem e o mal. Por isso, o cristão, caso deseje seguir o bem em tudo deve sempre submeter a sua vontade à vontade do Criador.

Às vezes, surge dúvida ao homem: por que Deus, infinitamente bondoso e sábio, permite o mal? Não poderia Ele ter criado este mundo ideal, sem disputas, sofrimentos e morte? A resposta a essa dúvida não é fácil. Ivan, em "Irmãos Karamazov" utilizava o argumento de sofrimentos inocentes da criança para justificar a sua falta de fé.

Caso se olhe o mal apenas nos limites desta vida material, é impossível entender porque Deus o permite.

Os materialistas explicam sofrimentos como algo indesejável, mas estatisticamente inevitável. No seu entender, a vida do homem é um emaranhado de injustiças e na verdade, sem sentido.

A teologia escolástica vê os sofrimentos como castigo pelo pecado, pessoal ou original. Essa é uma resposta jurídica, formal que não combina com o ensinamento cristão sobre o Deus do amor e do perdão total.

Para entender os sofrimentos dos inocentes deve-se vê-los no plano da eternidade, à qual o homem é chamado. Nós acreditamos que Deus não manda os sofrimentos físicos, mas os permite para recompensar os sofredores e pacientes com a bem-aventurança eterna.

Os filósofos, que tentam explicar o problema do bem e do mal apenas no plano da vida temporária, não conseguem dar uma resposta satisfatória.

O que dizer sobre o fato do Deus permitir o mal moral? Por que Ele permite que o pecado arruíne o homem? Essa questão está intimamente ligada com o livre arbítrio do homem.

Deus poderia ter nos criado sem a possibilidade de escolher entre o bem e o mal. Nesse caso, nós não seríamos homens, mas robôs ou animais. Sem a liberdade de escolha não existe o bem moral, mas apenas um movimento mecânico, programado. Foi vontade do Criador bondoso dar-nos o livre arbítrio, para que pudéssemos desenvolver-nos espiritualmente e desta forma, de alguma maneira assemelhar-se a Ele, como as crianças assemelham-se no aspecto físico com os pais. Por isso, o livre arbítrio é um Dom Superior, que eleva o homem sobre toda a natureza. No entanto, deve-se saber usar esse dom. Ele é semelhante ao fogo que é tão necessário à vida, mas que em caso de utilização inábil ou negligente, oculta em si um grande perigo.

 

O Zelo (cuidados) de Deus

A uma pessoa pouco observadora e que leva um modo de vida dispersivo, parece que os acontecimentos vão se precedendo em seu curso normal e tudo vem a ser resultado de um encontro casual de circunstâncias e coincidências. A essas pessoas pouco sérias, parece que Deus, se é que Ele existe, encontra-se distante no céu e que Ele não se interessa pelo nosso mundo, pois esse mundo é demasiado pequeno e insignificante aos olhos Dele. Pessoas que pensam assim são as chamadas deístas.

O ensino deísta sobre Deus recebeu uma ampla divulgação no Ocidente nos últimos séculos, quando as pessoas começaram a perder o contato vivo com Deus na igreja, nas orações e nos mistérios. Essas pessoas são normalmente ao mesmo tempo, supersticiosas. Atribuem uma grande importância à influência das estrelas sobre a vida do homem, dão importância a sinais tolos como por exemplo: o gato preto não deve cruzar seu caminho; não se deve cumprimentar alguém sobre a soleira da porta; não dormir com os pés voltados para a porta; não espalhar sal sobre a mesa; etc ... A maioria das pessoas possuem uma quantidade enorme de superstições e isto somente serve para complicar a vida delas. É melhor não prestar nenhuma atenção a essas superstições, já que Deus governa o universo como um todo e a vida de cada um em particular.

Nós rezamos: "Pai nosso que estás nos céus," mas sabemos ao mesmo tempo, que Deus está em todos os lugares, já que Ele é um Espírito puríssimo, onipresente.

Por isso Davi o cantador de salmos exclama:

"Para onde irei a fim de me subtrair ao Teu espírito? E para onde fugirei da Tua presença? Se subo ao céu, Tu lá estás; se desço ao inferno, nele Te encontras. Se tomar asas ao romper da aurora, e for habitar no extremo do mar, ainda lá me guiará a Tua mão, e me tomará a Tua direita. E disse: Talvez me ocultarão as trevas; mas a noite converte-se em claridade para me descobrir no meio dos meus prazeres. Porque as trevas não são escuras para Ti; a noite brilha como o dia, e a escuridão, como a claridade" (Salmo 138:7-12).

Alguns concordam com a idéia que o mundo como um todo, é governado por Deus e não pelo acaso. No entanto, eles pensam que Deus não cuida de cada um em particular, já que somos indignos e insignificantes e que Deus não irá cuidar dessa infinidade de seres. Mas esse raciocínio é incorreto e pecaminoso.

Se Deus criou até mesmo os micróbios e deu a cada um deles forma e organização especial, por que essas criaturas seriam indignas dos cuidados posteriores de Deus? Deus deu-lhes a vida e Ele zelará pela vida delas.

Dizem que há seres vivos em demasia. Mas com que direito atribuímos nós a nossa limitação a Deus, que é infinito em Suas perfeições? E se Ele, além do nosso mundo, tiver criado bilhões de mundos com um número infindável de homens, animais, insetos e bactérias; nem mesmo assim o Senhor se cansaria de zelar pela vida de cada um em particular.

Alguém vai dizer que todas essas criaturas são tão pequenas e insignificantes; mas o nosso conceito de tamanho nós criamos em relação a nós mesmos. O que é grande aos nossos olhos é ínfimo perante a magnitude de Deus e o que nos parece pequeno, é grande para a Sua bondade e amor. O Senhor cuida de tudo, dá vida a todos e conduz para a vitória da verdade e do bem.

O Salvador disse, que nem mesmo o menor pássaro cai, sem que seja por vontade de nosso Pai (Mateus 10:29), quanto mais em nossas vidas, nada pode acontecer sem a Sua vontade. Tudo que é bom é dádiva do Senhor, já que Ele é a fonte eterna de bondade.

Tudo que é mau não é mandado diretamente por Deus, porque Nele não há, nem a sombra do mal. Mas o Senhor permite às vezes o mal para nosso benefício e salvação. Nesse caso, diversos acontecimentos desagradáveis tem a mesma ação que os remédios amargos e ruins, mas que, ao mesmo tempo, salvam. Quase todos os remédios e operações cirúrgicas são desagradáveis para nós, mas recorremos a eles, pois sabemos que são necessários para a saúde.

Todos os homens devem saber claramente, que somente Deus é a fonte de felicidade, paz e bem-aventurança. Os consolos e as alegrias do mundo visível, o Senhor criou por causa da nossa natureza física. Mas o homem tendo uma alma dotada de razão, usufruindo de tudo com moderação, não deve esquecer-se de Deus, pois a alma não pode se satisfazer com nada que é terreno e material.

Na maioria dos casos, nós, com certa insaciabilidade satisfazemos os nossos desejos materiais e esquecemos completamente da alma e de suas necessidades espirituais. Por isso, o Senhor não querendo que desçamos da nossa vocação de sermos filhos de Deus até o nível de animais irracionais, manda-nos diversos sofrimentos. Desta forma, quando somos derrotados no que procuramos irracionalmente, aos poucos começamos a entender a agitação inútil da nossa atividade e nos voltamos para Deus.

Devemos saber firmemente que Deus é infinitamente bom e que Ele deseja somente a nossa felicidade e salvação, por isso devemos receber Dele com gratidão, também as diversas tristezas.

As crianças não deixam de amar seus pais quando estes as castigam injustamente, pois sabem que os pais só querem o seu bem. O Senhor, como é dito nas Escrituras, castiga a quem ama.

Já que Deus constantemente cuida de nossa vida e salvação, devemos também aprender como seguirmos os Seus cuidados e não agirmos de acordo conforme queremos.

Algumas vezes observamos que coisas acontecem em nossa vida, não de acordo com o que desejamos. Aí ficamos zangados, indignados, reclamamos da sorte e somente depois passado alguns anos, entendemos que foi melhor assim como aconteceu e se fosse de outra maneira seria muito pior. Nós cristãos, não devemos alegrar-nos tanto com nossos sucessos, mas agradecer a Deus pelas tristezas, já que elas nos limpam das paixões, enquanto que os sucessos materiais levam-nos ao esquecimento de Deus e do objetivo de nossa vida terrena.

 

A Fé na Santíssima Trindade

A base da fé cristã repousa sobre o ensinamento de Deus-Trindade, Deus é único e em três Pessoas. O Pai é Deus, o Filho é Deus e o Espírito Santo é Deus. No entanto, existe um só Deus, e não três. O conceito de pessoa está ligado ao conceito de personalidade, autoconsciência, individualidade. Na vida diária, as personalidades auto conscientes formam seres distintos. Seria simples entender o ensinamento sobre a unidade divina, caso se dissesse que existem 3 forças divinas ou três atitudes ou 3 manifestações, mas como tentar entender e sentir o ensinamento, que em Deus as três Pessoas constituem um único Ser?

Para permanecer fiel ao ensinamento cristão sobre Deus, deve-se aceitar a idéia de que o entendimento da vida interior da Divindade está acima da nossa inteligência limitada. Por isso, é necessário compensar a falta de compreensão pela fé, para entender a verdade da Divina Trindade.

O homem não pode estudar o sol diretamente, porque na tentativa de aproximar-se dele, será queimado. No entanto, o homem vive, move-se e alimenta-se graças à luz do Sol. Da mesma maneira, nós não temos condições de entrar em contato tão íntimo com Deus, para conhecer por experiência os mistérios da Sua vida interior. No entanto, a luz de Sua graça aquece os nossos corações e ilumina a nossa mente. Essa Luz Divina penetra em nós, quando nós abrimos as nossas almas para Ela. Essa Luz também emana da inspirada Escritura, que vem de Deus e ensina sobre Deus.

As Três Pessoas em Deus tem suas propriedades pessoais que são: o Pai — não foi gerado; o Filho — gerado do Pai; o Espírito Santo — procede do Deus Pai.

A Escritura Sagrada utiliza diferentes termos para se referir às propriedades pessoais. No entanto, a diferença entre "geração" e "procedência" não podemos explicar. A palavra "gerado" em relação ao Filho, normalmente se encontra no passado e a palavra "procede" em relação ao Espírito Santo, encontra-se no presente. Essas diferentes formas gramaticais de tempo não demonstram relação alguma com o tempo: tanto "geração" como "procedência" são "pré existentes," i.é., fora do tempo.

O Pai nunca esteve sem o Filho e sem o Espírito. Ele sempre esteve na Trindade, pois Deus é inalterável e imutável. Cada Pessoa da Trindade possui a plenitude da perfeição: é eterno, onipotente, onipresente, infinitamente bondoso e justo. Todas as Pessoas da Trindade participaram na criação do mundo e do homem, como se vê na Escritura: "... se tornou como um de Nós ..." (Gên. 3:22).

A utilização do plural no Antigo Testamento: "façamos o homem à Nossa imagem e semelhança" (Gen 1:26); e mais tarde: "Eis que Adão se tornou como um de Nós" só se torna compreensível no contexto do ensinamento do Novo Testamento sobre a Santíssima Trindade.

As tentativas de aproximar o ensinamento sobre a Trindade à experiência da nossa vida física, invariavelmente levaram à distorção desse ensinamento. Durante a história do cristianismo surgiram muitos ensinamentos não ortodoxos sobre o Deus Único em Três Pessoas. Eles se dividem em duas categorias: ou diminuíam a dignidade Divina da Segunda e Terceira Pessoa e entendiam essas Pessoas, como criaturas superiores a nós humanos, mas inferiores em relação ao Pai, i.é., semelhantes a "semi-deuses" (Ária, Macedônio, Paulo Samosatski); ou então entendiam a Segunda e a Terceira Pessoa como manifestações ou formas de revelação da Primeira Pessoa (modalistas).

Tais ensinamentos que distorcem a fé correta na Santíssima Trindade, são chamados "Anti-Trinitares." Eles são atraentes pela sua lógica do ponto de vista da limitada inteligência humana. Podemos anexar às seitas modernas anti-trinitares os Testemunhas de Jeová, Christian Science, seguidores do Moon e algumas outras seitas.

Se os esforços para entendermos completamente o ensinamento sobre a Santíssima Trindade, ocultam o perigo de distorcer a pureza da fé em Deus, aflora o pensamento: Deus nos anunciou isto sobre Si, porque a fé na Trindade é imprescindível para a compreensão de muitas verdades cristãs, Ela vem a ser o fundamento, sobre o qual se baseia a fé em Cristo Homem-Deus.

A Trindade em Pessoas de Deus é mostrada no Novo Testamento na vinda do Filho de Deus e na descida do Espírito Santo.

Enviando os apóstolos para pregar, o Senhor os mandou divulgar a fé na Santíssima Trindade: "Ide, pois, ensinai todas as gentes, batizando-as em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo" (Mateus 28:19), e "O que crer e for batizado, será salvo..." (Marcos 16:16).

Ele não disse: "em nomes," mas "em nome," já que Pai, Filho e Espírito Santo — é o nome do único Deus. "Com efeito, são Três os que dão testemunho no céu: o Pai, o Verbo e o Espírito Santo, e estes três são uma só coisa" (1 João 5:7) — escreve São João o teólogo.

Confirmam a fé na Santíssima Trindade, todos os lugares da Santa Escritura, onde se diz da unidade do Deus Pai e do Deus Filho, como por exemplo nos textos: "Meu Pai opera até hoje e eu opero também" (João 5:17); "Eu e o Pai somos um" (João 10:30). "O Pai está em mim e eu no Pai" (João 10:38). "E dos quais (judeus) é descendente o Cristo, segundo a carne, O Qual está sobre todas as coisas, Deus bendito por todos os séculos" (Romanos 9:5); "Quem me vê, vê também o Pai" (João 14:9).

Da mesma forma, há passagens nas Santas Escrituras onde o Espírito Santo é chamado Deus direta ou indiretamente: "Como é que satanás se apossou de teu coração, para que mentisses ao Espírito Santo? ... Não mentistes aos homens, mas a Deus," disse o apóstolo Pedro a Ananias (Atos 5:3-4). "Todo o que disser alguma palavra contra o Filho do Homem, lhe será perdoado; porém o que a disser contra o Espírito Santo, não lhe será perdoado, nem neste século nem no futuro" (Mateus 12:32).

O ensinamento sobre a geração do Filho do Pai e a procedência do Espírito do Pai aponta para as relações internas misteriosas das três Pessoas em Deus, para a vida do Deus em Si mesmo. Essas relações temporais, podemos distinguir claramente das manifestações da Santíssima Trindade no mundo criado, pelas ações de Deus no mundo a título de cuidados.

Essas manifestações (a título de cuidados de Deus) aconteciam em todos os tempos. Nos tempos históricos, o Filho de Deus nasceu da Virgem e o Espírito Santo desceu sobre os Apóstolos em forma de línguas de fogo.

Neste plano de salvação do homem a segunda pessoa da Santíssima Trindade colocou-se como se fosse inferior a Deus Pai. O Filho, conforme as palavras do apóstolo Paulo; "mas aniquilou-Se a Si mesmo, tomando a forma de servo," "Humilhou-Se a Si mesmo, feito obediente até a morte...." (Filipenses 2:7-8).

Também no plano de salvação, o Senhor Jesus Cristo fala sobre sua aparente desigualdade, em relação ao Pai: "... porque o Pai é maior do que Eu" (João 14:28); "A respeito, porém, desse dia ou dessa hora (do fim do mundo) ninguém sabe, nem os anjos do céu, nem o Filho, mas só o Pai" (Marcos 13:32); "... Meu Pai, se é possível, passe de Mim este cálice ..." (Mateus 26:39) e outras palavras semelhantes.

No seu conjunto elas se referem somente sobre relações temporárias entre o Pai e o Filho de Deus, que veio como Homem e que tomou para Si a obediência ao Pai, para corrigir a nossa desobediência. No entanto, é necessário lembrar que o fato de chamar Nosso Senhor Jesus Cristo de Deus, já por si só diz sobre a plenitude da Sua Divindade.

"Deus" não pode ser (do ponto de vista lógico e filosófico) "de segundo grau," "de categoria inferior," nem limitado de maneira alguma. As propriedades da natureza Divina não estão sujeitas a condicionamentos, nem a diminuições. Se é "Deus," é por inteiro e não em partes.

Desta forma, a fé correta na Santíssima Trindade, baseada nas Santas Escrituras, é necessária para a assimilação de toda plenitude das verdades cristãs. Mas esta fé pura não nos dá apenas um direcionamento correto para o pensamento, — ela nos dá o direcionamento necessário para a nossa vontade.

Realmente, o cristianismo convoca todas as pessoas para a unidade espiritual. Nesta unidade devem desaparecer inimizade, todo tipo de antipatia, rivalidade, hostilidade, isolamento egoísta, orgulho nacionalista, discriminação racial e tudo aquilo que causa briga e luta entre os homens.

No entanto, eliminando de nós tudo isso que é mesquinho, insignificante e pecaminoso, a nossa fé não reprime as boas qualidades pessoais e capacidades do homem. Pelo contrário, ela as enobrece ainda mais, dando oportunidade delas desabrocharem com maior vigor e brilho.

Desta maneira, nessa unidade espiritual perfeita dos cristãos, cada membro dessa comunidade renascido, reluzirá com a beleza das suas qualidades espirituais pessoais. Neste aspecto o ensinamento cristão é contrário ao budismo, o qual considera como ideal final a completa aniquilação psicológica, dissolução no NIRVANA.

No cristianismo, nós somos chamados a desenvolver e aperfeiçoar as nossas qualidades. Como ideal desta não fusão pessoal perante a unidade do ser, nós temos a Santíssima Trindade, como vemos na oração do Salvador: "... para que sejam todos um, como Tu, Pai, O és em Mim, e Eu em Ti, para que também eles sejam um em Nós" (João 17:21).

 

Vencendo a Ociosidade e o Desânimo

Minha alma adormeceu de tédio;

fortifica-me com as Tuas palavras (Salmo 118:28).

Todo homem instintivamente é atraído pela alegria, felicidade e pelo que é agradável. A sensação de alegria injeta no homem disposição e otimismo, enquanto que a falta dela faz sua vida cinzenta, sombria, sem sentido.

Pela graça de Deus, muitas coisas no mundo trazem alegria ao homem. Desde o início do seu surgimento na Terra, o homem se alegra com coisas e fenômenos tais como: comida e bebida agradável, o ar fresco, a luz solar, a beleza da natureza, contato com pessoas próximas e queridas. À medida que o homem vai se desenvolvendo, encontra novas fontes de alegria numa compreensão mais profunda do mundo e da coerência de suas leis, na arte, música e poesia. A capacidade do homem em distinguir o agradável do desagradável, tem um enorme significado no seu desenvolvimento físico e psíquico.

No entanto, muito cedo o homem se convence que somente objetos físicos e estéticos não podem satisfazê-lo plenamente, porque sente dentro de si necessidades espirituais. Essas necessidades espirituais se manifestam pela atração inconsciente e interna pelo bem, pela perfeição moral e pelo contato com Deus. Essas atrações criam nele uma sede ou fome espiritual. Caso o homem não dê importância a esta sede de sua alma, esta aumenta com o tempo e passa a ser um sentimento de vazio interior, de insatisfação e desânimo.

Jamais o homem teve ao seu dispor tantos e tão variados entretenimentos, como neste século XX. A vida está repleta de teatros, filmes, diversos objetos de diversão musical e eletrônica, competições esportivas, livros, jornais e revistas das mais variadas, etc ...

Aparentemente o homem atual deveria ser muito mais feliz que os seus antepassados. No entanto ocorre o inverso. O homem atual freqüentemente sente-se profundamente infeliz, mais infeliz do que foram seus pais e avós. O que nos leva a acreditar nisto, é o fato de que nunca antes na história da humanidade houve tamanho abuso de diversas drogas tais como: fumo, álcool, narcóticos, uso de drogas excitantes ou calmantes; apresentando um caráter de epidemia.

Além disso, sabe-se que uma porcentagem significativa dos habitantes de cidades grandes sofrem de diversas doenças psíquicas, que nem mesmo os melhores psiquiatras são capazes de curar. Essa alta incidência de doenças psíquicas, só pode ser explicada pelo desequilíbrio da complexa natureza humana: por um lado excesso de divertimentos externos e por outro, um enorme vazio espiritual.

Essas observações tristes da realidade, levam à conclusão, que é absolutamente necessário ao homem moderno, entender a causa do resultado da crise espiritual que se criou, e que ele deve em particular prestar atenção às suas necessidades espirituais. O homem compreendendo que é necessário restabelecer o equilíbrio entre as necessidades físicas e espirituais, vai por sua vez, como que dar um empurrão para o início da sua vida espiritual.

A vida espiritual, como todo processo interior, requer uma certa disciplina e sacrifício. Mas é através desse sacrifício e disciplina que nós alcançamos a paz e a alegria espiritual. Claro que nem todo sacrifício é benéfico, mas somente aquele que nos é mostrado pelo próprio Criador e nosso Salvador; aquele sacrifício que está descrito no Evangelho e que se concretiza na Igreja.

Deus deu à Igreja tudo que nossa alma deseja: graça e verdade. Por isso participando da vida Dela, obtemos a satisfação dos nossos anseios mais nobres e elevados. Bem aventurados somos nós, se tivermos a capacidade de entender isso e modificarmos a nossa vida de acordo!

 

9Ί Av

Nós cristãos, cremos que o Messias prometido pelos profetas, já veio há quase 2000 anos na figura do Nosso Senhor Jesus Cristo. A maioria dos judeus do tempo de Cristo, no entanto, não reconheceram Nele o Messias prometido por Deus e O rejeitaram. Eles desejavam ter como Messias um rei-conquistador, poderoso, que trouxesse glória e riqueza ao povo judeu. Cristo pregava pobreza por opção, mansidão, amor aos inimigos, o que no entanto era inaceitável para muitos de Seus contemporâneos.

Séculos se passaram, mas o sentimento religioso do povo judeu pouco se alterou e os judeus continuam a não reconhecer Cristo. No entanto, o apóstolo Paulo profetiza convictamente que, no final dos tempos, antes do fim do mundo, vai ocorrer uma conversão em massa dos judeus a Cristo.

Esse reconhecimento e fé de muitos judeus em Cristo como Salvador do mundo, coincidirá com o esfriamento geral de povos cristãos, em relação à sua fé de muitos séculos.

A profecia do apóstolo Paulo sobre a conversão do povo judeu, encontra-se nos capítulos 10 e 11 da Epístola aos Romanos. "Porque eu não quero, irmãos, que vós ignoreis este mistério (para que não vos julgueis sábios dentro de vós mesmos): que uma parte de Israel caiu na cegueira até que tenha entrado a plenitude dos gentios (na igreja), e assim todo o Israel se salve, como está escrito: Virá de Sião o libertador e afastará de Jacó a impiedade" (Romanos 11:25-26).

Durante os últimos 30-40 anos foram evidenciados sinais, de que a fé em Cristo entre os judeus está se revivendo. Numa série de grandes cidades dos EUA apareceram centros missionários de judeus cristãos que professam, entre seus irmãos de sangue, a fé em Nosso Senhor Jesus Cristo.

É muito interessante e instrutivo conhecer suas brochuras e livros sobre o tema religioso. É evidente que, quem redigiu essas brochuras entendia claramente as Sagradas Escrituras e a religião judaica do Antigo Testamento. Eles explicam clara e convincentemente as profecias sobre o Messias e Seu Reino de bem-aventurança.

Atualmente, em todo o mundo, existem aproximadamente 200 comunidades de judeus messiânicos, i.é, judeus cristãos, que observam seus costumes nacionais. Nas listas telefônicas, as suas comunidades aparecem sob a rubrica de Jewish Messianic.

Existem as seguintes comunidades judaico-cristãs: Union of Messianic Jewish Congregations, Fellowship of Jewish Congregations, International Alliance of Messianic Congregations and Synagogues, Messianic Jewish Alliance of America, Jews for Jesus, The Chosen People, American Board of Mission to the Jews, e outras. Os membros dessas comunidades aceitam os dogmas mais importantes do cristianismo e também esforçam-se em conservar sua identidade nacional, continuando a observar as festividades antigas judaicas e hábitos como por exemplo: o dia de sábado, circuncisão, Páscoa e outros.

Outras informações sobre o movimento Messiânico judaico podem ser encontradas nos livros: "Return of the Remnant," de Dr. Michael Schiffman, Lederer Publication, Baltimore, Maryland, 1992 e no "Messianic Jews," de John Fieldsend, Marc Olive Press, Monarch Publications 1993.

Algumas comunidades messiânicas editam ativamente revistas e livros, nos quais provam convincentemente aos seus irmãos judeus, baseando-se nas profecias do Antigo Testamento, que o Senhor Jesus Cristo é o Messias prometido.

Esse tipo de literatura pode-se conseguir por exemplo, na editora Jews for Jesus, 60 Haight St, San Francisco, CA 94102, tel: (415) 864-2600.

Além das profecias do Antigo Testamento, existe na própria história do povo judeu um fato muito convincente a favor do reconhecimento de Nosso Senhor Jesus Cristo como o Messias. Este fato, é a destruição pela segunda vez do Templo do Velho Testamento em Jerusalém no 9Ί dia do mês de Av.

Aqui deve-se relembrar de relance que os eventos religiosos judeus são contados pelo calendário lunar. O primeiro mês do ano dos judeus é o Nisan. Ele corresponde ao final de março ou início de abril. Av é o quinto mês do calendário judeu (caindo em julho ou início de agosto pelo nosso calendário).

O calendário adotado no Ocidente baseia-se no solar. Ele não coincide de ano para ano com as mesmas datas do calendário lunar, mas sofre desvios para mais ou menos algumas semanas. Como a ressurreição de Nosso Senhor Jesus Cristo ocorreu nos dias da Páscoa judia (que se comemora nos meados do mês Nisan), a data da Páscoa cristã é calculada pelo calendário lunar e por isso cai todos os anos em datas diferentes.

O dia 9 do mês Av, vem a ser um dia de pesar para os judeus, pois nesta data são lembradas a primeira e a segunda destruição do Templo de Jerusalém. Essa destruição causou grande dor para o seu povo. Enquanto que os cristãos podem construir suas igrejas onde quer que haja necessidade delas, a lei do Antigo Testamento permitia aos judeus ter apenas um templo no local indicado por Deus — em Jerusalém.

O Primeiro Templo do Antigo Testamento foi construído pelo rei Salomão 950 anos aC. Esta foi a construção mais grandiosa e ricamente ornamentada da época. Foi uma verdadeira "obra-prima" de arquitetura. O rei Nabucodonosor da Babilônia a destruiu no dia 9 do mês Av no ano 586 A.C. Tendo regressado do cativeiro babilônico 70 anos depois, os judeus construíram um novo Templo no mesmo lugar, embora não tenha sido tão grandioso e ricamente ornamentado como o templo de Salomão. E este Segundo Templo, no qual o Senhor Jesus Cristo orava, foi também destruído por legiões romanas sob o comando de Tito no ano 70 A.C. e novamente no dia 9 do mês Av!

O Senhor Jesus Cristo previu com muitos detalhes a destruição do Segundo Templo de Jerusalém e da própria cidade de Jerusalém dizendo, "derrubarão por terra a ti e aos teus filhos, que estão dentro de ti e não deixarão em ti pedra sobre pedra, porque não conhecestes o tempo em que fostes visitada" (Lucas 19:44).

Os historiadores observaram a fatal coincidência das datas de destruição dos dois templos em Jerusalém. Os judeus guardam jejum rigoroso no dia 9 Av, para recordar este acontecimento tão trágico. Para os judeus, o Templo de Jerusalém tinha significado não apenas religioso mas também nacional. O Templo era o centro da vida para todo o povo. Nele se comemoravam todas as mais importantes festas nacionais. O templo unia as tribos judaicas em um só povo e foi o lugar onde Deus ateve-se com a nação eleita. De acordo com a esperança dos judeus, o Messias deveria ser entronizado e anunciar-se no Templo de Jerusalém.

E eis que o Templo não existe mais! As sinagogas não são templos mas sim casas de oração, as quais não podem normalmente serem usadas para adoração, assim prescrito pela lei de Moisés. A destruição do Templo significa para os judeus ortodoxos, que Deus ficou irado com o Seu povo e rejeitou seus sacrifícios e oferendas.

Porque foram o Primeiro e o Segundo Templo destruídos na mesma data? Seria apenas uma coincidência? Os judeus crêem que Deus governa a vida de Sua nação eleita e não podem admitir que isto foi um simples acaso, em uma causa tão importante. As datas de destruição dos dois templos coincidiram, devido a igualdade ou similaridade das causas íntimas da destruição, isto é, os pecados do povo judeu eram igualmente grandes, os quais provocaram as duas destruições.

Tentemos julgar e entender a essência desses pecados. Antes da destruição do Primeiro Templo por Nabucodonosor, os profetas do Antigo Testamento, preveniram durante mais de 100 anos o seu povo, que caso eles não deixassem de adorar aos ídolos, o Senhor iria enviar um destruidor que levaria à ruína suas cidades e o Templo; mataria parte do povo e levaria o restante como cativo para Babilônia. Os judeus não acreditaram nessas profecias; continuaram a venerar os ídolos e as profecias se cumpriram.

E qual foi o pecado dos judeus antes da destruição do Segundo Templo? Não foi o pecado da idolatria.

Os judeus não somente desprezaram os ídolos pagãos, mas também se tornaram muito devotos, seguindo fervorosamente todas as prescrições do ritual da sua lei. No entanto, o Templo e toda a cidade de Jerusalém estava destruída, mas a quantidade de vítimas dessa guerra e todos os outros fatos que se seguiram, mostraram-se cem vezes mais trágicos, do que aqueles que os judeus sofreram durante a invasão de Nabucodonosor.

Comparemos os fatos; o cativeiro da Babilônia durou apenas 70 anos, mas a dispersão dos judeus depois de Tito durou aproximadamente 2 mil anos. De fato, foi somente após a Segunda Guerra Mundial que os judeus tiveram a possibilidade de recriar a sua nação. Durante o domínio de Nabucodonosor morreram dezenas de milhares de judeus; durante o domínio de Tito e nos anos seguintes morreram milhões.

Porque o pecado dos judeus nos tempos de Tito foi pior que o pecado da idolatria de seus antepassados? A resposta para essa pergunta pode ser encontrada no Livro do Deuteronômio, no qual Moisés escreveu as seguintes palavras de Jeová, a respeito da vinda do Messias: "Eu lhes suscitarei do meio de seus irmãos um profeta semelhante a ti; porei na Sua boca as Minhas palavras e Ele lhes dirá tudo o que Eu lhe mandar. Mas o que não quiser ouvir as palavras que Ele disser em meu nome, Eu me vingarei dele" (Deuteronômio 18:18-19).

O novo e mais pesado pecado do povo judeu foi a rejeição do Messias enviado por Deus! Os judeus não apenas rejeitaram o seu Salvador, mas também O ultrajaram e O crucificaram. Não importa o que os teólogos modernos dizem para aliviar a culpabilidade dos judeus na Crucificação de Cristo; os fatos são evidentes. Poncio Pilatos e os soldados romanos apenas cumpriram o desejo dos sumo sacerdotes judeus, dos anciãos e de toda a multidão. Após a Ressurreição de Nosso Senhor Jesus Cristo dos mortos, os culpados pela Sua Crucificação não se arrependeram de seu crime. Apenas uma pequena parte do povo judeu acreditou em Cristo; a maioria continuou surda à pregação do Evangelho e alguns deles perseguiram e mataram brutalmente os apóstolos e os cristãos.

Esse pecado de oposição a Deus fez transbordar o cálice da paciência de Deus e o Templo foi destruído. A coincidência das datas da destruição do Primeiro e Segundo Templo é uma indicação de Deus, pois a segunda destruição ocorreu, não por força das circunstâncias políticas e nem pelo fracasso da guerra com os romanos, mas como castigo pelo terrível pecado do povo judeu — o assassinato de Jesus Cristo e a incredulidade posterior Nele. Para aumentar o castigo deles, serviram também os gritos da multidão de judeus: "O Seu sangue caia sobre nós e sobre nossos filhos" (Mateus 27:25). O desafio a Deus estava lançado.

Nós lembramos essas circunstâncias não para repreender o povo judeu, mas para ajudá-los a compreender a essência espiritual de tudo que se passou com eles. O povo russo, com a sua revolução sangrenta, destruição dos templos, profanação, sacrilégio e eliminação do clero, também cometeu um grande pecado contra Deus. Semelhante aos judeus dos tempos de Nabucodonosor, nós sofremos exílio já há mais de 70 anos.

O cativeiro babilônico cessou quando os judeus entenderam o seu pecado, se arrependeram e voltaram-se para Deus de todo coração. Nós esperamos que agora também os judeus entendam o pecado de seus pais, que foi a rejeição do Messias enviado por Deus; que creiam Nele como Salvador e Deus irá tirar-lhes o pecado e devolver-lhes a Sua benevolência. Nós acreditamos, que este acontecimento alegre profetizado pelo apóstolo São Paulo, acontecerá um dia e gostaríamos de vê-lo com nossos próprios olhos!

 

 

Folheto Missionário número P84

Copyright © 2001Holy Trinity Orthodox Mission

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Editor: Bishop Alexander (Mileant)

 

(apolog_zametky_p.doc, 07-30-2001)